INTRODUÇÃO
As síndromes do neurônio motor correspondem ao conjunto de sinais e sintomas indicativos de que os impulsos motores que partem do centro não chegam à periferia.
ANATOMIA
SISTEMA PIRAMIDAL (CORTICOESPINHAL, NEURÔNIO MOTOR SUPERIOR OU 1º NEURÔNIO)
TRATOS CORTICOESPINHAIS
Unem o córtex cerebral aos neurônios motores da medula. Um terço de suas fibras originam-se na área 4, área motora primária, um terço na área 6, áreas pré-motora e motora suplementar, e um terço no córtex somatossenssorial. As fibras têm o seguinte trajeto: área 4 (córtex do giro pré-central), coroa radiada, perna posterior da cápsula interna, base do pedúnculo cerebral, base da ponte e pirâmide bulbar.
10 a 25 % das fibras continuam ventralmente e do mesmo lado (suas fibras não cruzam) e formam o trato corticoespinhal anterior. Na medula, ele ocupa o funículo anterior até o nível torácico médio. Os seus axônios relacionam-se com interneurônios que, por sua vez, se relacionam com o 2° neurônio motor contralateral após cruzar o plano mediano (T6), responsáveis pelos movimentos voluntários da musculatura axial.
75 a 90% das fibras cruzam (piramide bulbar) o plano mediano e do lado oposto para constituir o trato corticoespinhal lateral (mais importante). Ao longo de toda a medula, ele ocupa o funículo lateral e seus axônios se relacionam com interneurônios que, por sua vez, se relacionam com o 2° neurônio motor deste mesmo lado. Relacionados com movimentos mais distais.
Algumas fibras deste trato tem função sensitiva, mas a principal função é motora somática, é o principal trato responsável pela motricidade voluntária.
Um sintoma sempre presente nos pacientes com lesão do trato corticoespinhal é a perda da capacidade de fracionamento de um movimento. Por exemplo, não conseguem movimentar os dedos da mão ou pé isoladamente (abotoar a camisa é impossível). Esta função é exclusividade do trato corticoespinhal.
TRATO CORTICONUCLEAR
Tem o mesmo valor funcional do trato corticoespinhal, diferindo deste principalmente pelo fato de transmitir impulsos aos neurônios motores do tronco encefálico e não aos da medula. Assim, o trato corticonuclear põe sob controle voluntário os neurônios motores situados nos núcleos motores dos nervos cranianos.
As fibras originam-se principalmente na parte inferior da área 4 (na região correspondente à representação cortical da cabeça), passam pelo joelho da cápsula interna e descem pelo tronco encefálico, associadas ao trato corticoespinhal. À medida que o trato corticonuclear desce pelo tronco encefálico, dele se destacam feixes de fibras que terminam nos neurônios motores dos núcleos da coluna eferente somática (núcleos do III, IV, VI e XII) e eferente visceral especial para núcleo ambíguo (IX e X) e motor do V e VII.
Do mesmo modo que o trato corticoespinhal, algumas fibras destacam-se para núcleos sensitivos, grácil, cuneiforme, do trigêmeo e trato solitário, relacionando-se com o controle dos impulsos sensoriais.
Existe uma diferença que tem importância clínica entre os tratos corticoespinhal e corticonuclear. Enquanto as fibras do trato corticoespinhal são fundamentalmente cruzadas, o trato corticonuclear tem grande número de fibras bilaterais. Essa representação bilateral é mais acentuada nos grupos musculares que não podem ser contraídos voluntariamente de um lado só, como os músculos da laringe e faringe, os músculos da parte superior da face (orbicular, frontal e corrugador do supercílio), os músculos que fecham a mandíbula (masseter, temporal e pterigoideo medial) e os músculos motores do olho. Por esse motivo tais músculos não sofrem paralisia quando o trato corticonuclear é interrompido de um só lado.
Os neurônios motores do núcleo do nervo facial, responsáveis pela inervação dos músculos da metade inferior da face, recebem fibras corticonucleares do córtex do lado oposto, enquanto os responsáveis pela inervação dos músculos da metade superior da face recebem fibras corticonucleares do córtex dos dois lados. Esse fato permite distinguir as paralisias faciais centrais das periféricas.
SISTEMA MOTOR MEDIAL OU VIAS MOTORAS EXTRAPIRAMIDAIS
São vias motoras acessórias, mais antigas filogeneticamente, que não passam pela pirâmide bulbar, mas se conectam a motoneurônios inferiores de localização medial, que comandam os movimentos da musculatura axial e proximal. Desta forma, participam da manutenção de postura e do controle do tônus muscular. Sua existência justifica porque os pacientes com síndrome do NMS não apresentam usualmente déficits de força completos. Estes indivíduos ainda preservam a movimentação axial e proximal, controladas por estas vias acessórias. O NMS e o trato corticoespinhal lateral estão envolvidos no controle dos movimentos da musculatura apendicular, responsáveis pelos movimentos finos.
TRATO RUBROESPINHAL
Possui um número reduzido de fibras. Origina-se no núcleo rubro do mesencéfalo, decursa e reúne-se ao trato corticoespinhal no funículo lateral da medula. A principal aferência para o núcleo rubro é também a área motora primária (via córtico-rubroespinhal). Trata-se, portanto de uma via indireta que foi perdendo sua importância, ao longo da evolução, para a via direta corticoespinhal. Em casos de lesão deste, no entanto, o trato rubroespinhal pode exercer papel na recuperação de funções da mão.
TRATO TECTOESPINHAL
Tem sua origem no colículo superior (área responsável pela movimento de constante fixação dos olhos em um objetivo quando estamos andando). O colículo superior recebe fibras da retina e do córtex visual. Este trato termina nos seguimentos mais altos da medula cervical, controlando o movimento cervical direcionado pelo olhar.
TRATO VESTIBULOESPINHAL
São dois, medial e lateral. Vai dos núcleos vestibulares (tronco encefálico) aos neurônios motores inferiores da medula espinhal carregando informações necessárias à manutenção do equilíbrio – ajustes no grau de contração da musculatura, mesmo em alterações súbitas do movimento e postura.
TRATO RETICULOESPINHAL
Promovem a ligação de várias áreas da formação reticular com os neurônios motores da medula. A essas áreas chegam informações de setores muito diversos do sistema nervoso central, como o cerebelo e o córtex pré-motor. São dois, o trato reticuloespinhal pontino aumenta os reflexos antigravitacionais da medula, facilitando os extensores e a manutenção da postura ereta. Atua mantendo o comprimento e a tensão muscular. O trato reticuloespinhal bulbar tem o efeito oposto, liberando os músculos antigravitacionais do controle do reflexo.
Controlam os movimentos tanto voluntários como automáticos, a cargo dos músculos axiais e proximais dos membros, e pertencem ao sistema medial da medula. Coloca o corpo em uma posição de partida e dá suporte aos movimentos mais finos planejados pelo trato corticoespinhal lateral. Ele justifica a preservação dos movimentos proximais e axiais na síndrome de NMS.
SISTEMA DO NEURÔNIO MOTOR INFERIOR OU 2° NEURÔNIO MOTOR (NMI)
A parte periférica do sistema motor é composta por: NMI (corno anterior da medula espinhal), núcleos motores dos nervos cranianos, raízes nervosas anteriores, plexos e nervos periféricos e junção neuromuscular.
Os NMI estão localizados no corno anterior da medula espinhal. São compostos pelos NMI alfa e gama. Os NMI alfa recebem projeções do trato corticoespinhal lateral, das vias extrapiramidais e de fibras que entram pelas raízes posteriores. Eles enviam projeções, através das raízes anteriores e nervos periféricos, às fibras musculares extrafusais. Os NMI também recebem projeções das mesmas fibras, seja diretamente, seja através de interneurônios. Eles se projetam às fibras dos fusos musculares, regulando sua função.
As unidades motoras são compostas por um NMI, seus axônios, ramos de seus axônios e pelas fibras musculares inervadas por ele. Todos os impulsos relacionados ao movimento são integrados nas unidades motoras e transmitidas às fibras musculares. Os músculos que participam de movimentos finos possuem maior número de unidades motoras (uma unidade para 5 – 20 fibras), ao passo que aqueles que se contraem de forma indiferenciada possuem menos unidades (uma para 100 0 500 fibras).
Sintomas | 1º Neurônio motor | 2º Neurônio motor | Neuropatia Periférica | Miastênica |
Fraqueza | Difusa e distal nos MM, preservando músculos axiais | Focal, geralmente distal | Focal, geralmente distal | Difusa e flutuante |
Tônus | Hipotônico no início, mas Hipertônico após dias a meses | Hipotonia ou atonia | Flácido ou normal | Normal |
Trofismo muscular (atrofia) | Presente em fase tardia por desuso | Acentuada e precoce | Presente e moderada | Ausente |
Fasciculação | Ausente | Presente (lesões do corno anterior) | Ausentes, ou presentes se lesão axonal motora | Ausentes |
Alteração da sensibilidade | Ausente, ou presente se houver lesão de vias sensitivas associadas | Ausente | Presente | Ausente |
Reflexos | Diminuídos ou ausentes no início, mas hiperativos após dias a meses | Diminuídos ou ausentes | Diminuídos ou ausentes | Normais |
Reflexo cutâneo-abdominal | Ausente | Pode estar presente ou ausente nas lesões dos nervos abdominais | ||
Reflexo cutâneo-plantar | Em extensão (Babinski) | Em flexão ou abolido | ||
Marcha | Hemiplégica ou ceifante | Escarvante |
SÍNDROME DO 1º NEURÔNIO (PIRAMIDAL)
DIAGNÓSTICO TOPOGRÁFICO
HEMIPARESIA COMPLETA E PROPORCIONADA
O paciente apresenta o mesmo grau de déficit entre MS e MI e há comprometimento facial. A lesão é contralateral e está próximo à cápsula interna (há concentração das fibras do trato corticoespinhal em uma pequena área, assim a lesão compromete a força de forma igual).
HEMIPARESIA COMPLETA E DESPROPORCIONADA
O paciente apresenta graus de déficit diferentes entre MS e MI, com predomínio braquial ou crural. Neste caso, há envolvimento do córtex do giro pré-central contralateral. Como há distintas representações corporais no “homúnculo de Penfield”, é possível que haja comprometimento maior de parte destas áreas, determinando a desproporção entre os déficits.
HEMIPARESIA INCOMPLETA E PROPORCIONADA
O paciente apresenta o mesmo grau de déficit entre MS e MI, sem envolver a face. Geralmente, a lesão comprometeu uma região restrita do córtex motor ou da cápsula interna contralaterais (atingiu um ramo arterial e não o tronco arterial), preservando as regiões que controlam a face.
HEMIPARESIA INCOMPLETA E DESPROPORCIONADA
O paciente apresenta graus diferentes de déficit entre MS e MI, sem haver envolvimento da face. Há comprometimento do córtex motor ou a área 4 de Brodmann na região superior ou axial do cérebro, comprometendo de forma desigual os ramos da artéria cerebral média.
PARAPARESIA
Déficit de força nos MMII. Há comprometimento em duas possíveis regiões: ambos os funículos laterais da medula espinhal cervical ou torácica (onde passa o trato corticoespinhal lateral) ou córtex frontal medial bilateral (representação dos músculos dos MMII no homúnculo de Penfield).
TETRAPARESIA
Déficit de força nos 4 membros, quando decorrente de única lesão. Há comprometimento de ambos os funículos laterais da medula cervical (onde passa o trato corticoespinhal lateral).
CAUSAS
AVE, trauma, esclerose múltipla (neuropatia desmielinizante autoimune), esclerose lateral amiotrófica (doença degenerativa do 1º e 2º neurônios), compressão da via piramidal (tumores, abscessos bacterianos, tuberculomas, neurotoxoplasmose).
DIAGNÓSTICO
O exame físico determina grosseiramente a topografia da lesão. Tomografia computadorizada em casos agudos. Ressonância magnética em casos crônicos ou estáveis.
SÍNDROME DO 2º NEURÔNIO MOTOR
DIAGNÓSTICO TOPOGRÁFICO
Corno anterior: com fasciculações.
Raiz anterior: sem fasciculações.
MARCHA
A musculatura está hipotônica e o pé parece ser arrastado enquanto a pessoa anda. Marcha parética ou escarvante.
CAUSAS
Neuropatia motora multifocal, esclerose lateral amiotrófica (doença degenerativa do 1º e 2º neurônios), neuropatia periférica (lesão direta do 2º neurônio), infecciosas (poilomielite), atrofia muscular espinhal (infantil, intermediária, juvenil e adulta).
EXAMES COMPLEMENTARES
Tomografia computadorizada (casos agudos) e ressonância magnética da área lesada (casos crônicos ou estáveis).
SISTEMA EXTRAPIRAMIDAL
O sistema extrapiramidal é responsável pela modulação involuntária e automatismo dos movimentos, bem como pelo tônus muscular, trocando sinais com o córtex piramidal (área 4) e o córtex pré-motor extrapiramidal (área 6), nos quais estão armazenados os programas de atividades motoras coordenadas e sequenciais, aprendidos ao longo da vida, como o ato de dirigir veículos.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
Distúrbios hipercinéticos (exacerbação do movimento, exemplo: coreia) ou distúrbios hipocinéticos (de lentificação, exemplo: parkinsonismo).
CAUSAS
Doença de Parkinson (75%), neurolépticos, cerebrovascular (AVE), doença de Wilson.
REFERÊNCIAS
Machado, A; Haertel, LM. Neuroanatomia Funcional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2015.
Martins, MA; et al. Clínica médica, volume 6: doenças dos olhos, doença dos ouvidos, nariz e garganta, neurologia, transtornos mentais, 2ª ed. Barueri, SP, Manole, 2016.
Mutarelli, EG; Hadad, MS; Coelho, FF. Propedêutica Neurológica – Do Sintoma ao Diagnóstico. 2ª Ed. São Paulo: Sarvier, 2014.