Sinusite

INTRODUÇÃO

Idealmente, deve-se empregar o termo rinossinusite no lugar de sinusite, uma vez que as mucosas do nariz e seios paranasais são contíguas embriológica e anatomicamente e respondem de forma similar à terapia clínica.
Embora a rinossinusite ocorra com certa frequência na infância, ela é de difícil reconhecimento. Normalmente, o comprometimento da mucosa nasal por um processo infeccioso viral é acompanhado de acometimento dos seios paranasais, que usualmente é autolimitado e passa despercebido. Por outro lado, uma infecção bacteriana pode ter uma evolução grave e levar a complicações supurativas.

CLASSIFICAÇÃO

A rinossinusite é classificada como:
→ Viral autolimitada.
→ Bacteriana aguda: com duração inferior a quatro semanas e resolução completa dos sintomas.
→ Bacteriana subaguda: com mais de quatro semanas, porém menos de 12.
→ Crônica: com sinais e sintomas que persistem por mais de 12 semanas.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

SEIOS DA FACE

Para a correta compreensão fisiopatológica das rinossinusites infecciosas na infância, é importante compreender como ocorre o desenvolvimento e a pneumatização dos seios da face ao longo dos anos:
→ Ao nascimento: apenas os seios etmoidais são pneumatizados.
→ 4 anos: pneumatização dos seios maxilares.
→ 5 anos: pneumatização dos seios esfenoidais.
→ 7-8 anos até a adolescência: pneumatização dos seios frontais.

FISIOPATOLOGIA

A secreção dos seios paranasais caminha, através dos óstios, em direção aos meatos (cornetos), que formam a parede lateral da via nasal. A posição anatômica dessas estruturas faz com que a motilidade ciliar do epitélio seja o fator mais importante para uma drenagem bem sucedida.
A causa mais comum de rinossinusite é uma infecção viral das vias aéreas superiores, geradora de edema e inflamação da mucosa com produção de muco espesso, que obstrui os seios paranasais e permite proliferação bacteriana secundária. Aproximadamente 0,5 a 2% dos resfriados comuns complicam com sinusite bacteriana aguda. A seguir, em frequência, destaca-se a rinite alérgica, que leva a edema de mucosa, prejudicial à drenagem do óstio sinusal.
Outras condições associadas a alterações da mucosa ou do transporte mucociliar incluem ar frio e seco (cânula nasal de oxigênio), refluxo gastroesofagiano, fibrose cística, imunodeficiência e discinesia ciliar.
A obstrução anatômica da drenagem dos seios, seja por pólipos, corpos estranhos, adenoides hipertrofiadas, tumores (rabdomiossarcoma) ou desvio de septo, se constitui em outro fator de risco importante para o aparecimento de infecção paranasal.
Um batimento ciliar ineficiente e/ou a presença de um fator obstrutivo para a drenagem promove o acúmulo de secreções, no interior dos seios paranasais. As secreções retidas funcionam como um meio de cultura para o crescimento de bactérias.

ETIOLOGIA

Os agentes que mais comumente causam rinossinusite bacteriana aguda são o Streptococcus pneumoniae (30%), o Haemophylus influenzae (20%) e a Moraxella catarrhalis (20%). Na sinusite subaguda prolongada e na sinusite crônica, os micro-organismos isolados são o Staphylococcus coagulase negativo, o Staphylococcus aureus, o Streptococcus alfa-hemolítico e os anaeróbios. A presença de múltiplos micro-organismos é bem mais comum na rinossinusite crônica do que na aguda. A incidência de bactérias resistentes à betalactamase se aproxima de 50% nos casos crônicos.

FATORES DE RISCO

Os principais fatores de risco para sinusite bacteriana aguda são:
→ Resfriado comum (principal causa).
→ Rinite alérgica (segunda causa).
→ Exposição à fumaça de cigarro (pais fumantes).
→ Anormalidades estruturais (ex.: desvio de septo, corpo estranho nasal, pólipo nasal, hipertrofia de adenoide, etc.).
→ Disfunção ciliar (fibrose cística, síndrome de Kartagener).
→ Imunodeficiência humoral.
→ Refluxo gastroesofágico.
→ Tubos e sondas nasotraqueais: a sinusite é uma complicação infecciosa em potencial nos pacientes internados nas UTIs que utilizam dispositivos nasais. Estes obstruem os óstios de drenagem dos seios, predispondo à infecção geralmente por micro-organismos resistentes.
→ Imunossupressão: principalmente encontrada nos pacientes com transplante de medula óssea ou naqueles portadores de malignidades pode se desenvolver uma sinusite fúngica por Aspergillus (Mucormicose), grave e com potencial disseminação para o SNC.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Ao contrário da criança maior e do adolescente, a criança menor (< 5 anos) não manifesta dor facial, cefaleia, edema e sensibilidade à percussão da face. As manifestações mais comuns de rinossinusite na criança pequena são tosse e secreção nasal. A tosse geralmente persiste por mais de 10-14 dias e descarga nasal purulenta por mais 3-4 dias consecutivos.
A tosse é o principal sintoma de sinusite na infância e ocorre durante o dia e piora quando a criança encontra-se em posição supina, devido ao gotejamento pós-nasal. A secreção nasal pode ser clara ou purulenta. Febre, respiração com um odor desagradável, sensação de pressão em região frontal e diminuição do olfato são queixas observadas em crianças mais velhas. Em uma minoria dos pacientes, encontramos um quadro de instalação súbita, com febre de até 39ºC, secreção nasal francamente purulenta e edema orbitário.
A rinossinusite apresenta sinais e sintomas muito semelhantes a qualquer infecção viral de vias aéreas superiores, diferenciando-se destas principalmente pela duração do quadro. O pediatra deve pensar na existência de sinusite, quando uma infecção da via aérea superior não melhora e, eventualmente, piora cerca de 10 dias após seu início.
As complicações da rinossinusite bacteriana incluem celulites periorbitária e orbitária, trombose de seio cavernoso (proptose, vermelhidão e dor ocular), meningite, abscessos epidural e subdural e osteomielite.

EXAMES COMPLEMENTARES

Em crianças, o emprego de estudo radiológico dos seios da face na busca de opacificações, nível hidroaéreo e espessamento de mucosa (normal menor do que 4 mm) é desnecessário, pois tem pouca sensibilidade e especificidade em menores que cinco anos.
Há controvérsias quanto à indicação da radiografia simples em crianças maiores de seis anos com suspeita clínica de sinusite. Nos adolescentes e adultos, o exame radiológico é rotineiramente necessário. Veja abaixo as principais alterações radiológicas compatíveis com a sinusite:
→ Espessamento mucoso (> 4 mm).
→ Opacificação (velamento) do seio (comparar com o seio contralateral).
→ Nível hidroaéreo.
O estudo tomográfico para o diagnóstico é caro e muitas vezes requer sedação da criança para aquisição de imagens adequadas, o que pode ser um transtorno. A transiluminação ajuda menos ainda, uma vez que os seios da face normalmente são assimétricos em crianças.
A aspiração dos seios paranasais para identificação microbiológica é recomendada em crianças imunossuprimidas, na presença de complicações e na infecção não responsiva à antibioticoterapia.
A rinite alérgica, um fator predisponente para a rinossinusite, pode ser confundida com infecção dos seios paranasais. Esta condição pode ser detectada por uma triagem de IgE in vitro ou pelo teste cutâneo intradérmico. Outro método para identificação da rinite alérgica é a análise citológica da secreção nasal. O achado de eosinófilos, plasmócitos e mastócitos, identificados pela coloração de hematoxilina-eosina, confirma a presença dessa desordem.
O teste do suor para o diagnóstico de fibrose cística é recomendado para crianças com rinossinusite de repetição, principalmente se existirem manifestações pulmonares. Os testes de transporte mucociliar, pouco empregados em nosso meio, são utilizados na suspeita diagnóstica de discinesia ciliar, incluindo a síndrome de Kartagener (sinusite de repetição, situs inversas e bronquiectasias).
Na prática, os pediatras iniciam a antibioticoterapia com base somente em dados clínicos. Os estudos radiológicos contribuem pouco, uma vez tomada a decisão em tratar o paciente.

TRATAMENTO E MANEJO

Recomenda-se o tratamento antimicrobiano das rinossinusites agudas da infância para evitar complicações supurativas, embora se saiba que 50-60% delas se resolveriam espontaneamente, sem a necessidade de antibioticoterapia.
A escolha inicial poderá ser feita com amoxicilina 45-50 mg/kg/dia, ou para pacientes alérgicos à penicilina, sulfametoxazol-trimetoprim, cefuroxima ou macrolídeos (ex.: claritromicina ou azitromicina). Indica-se a amoxicilina + clavulanato na dose de 80-90 mg/kg dia para crianças < 2 anos, aquelas que frequentam creche, para aquelas que usaram antibiótico prévio nos últimos três meses ou ainda, sempre que se suspeite de pneumococo com resistência intermediária (ex.: ausência de resposta clínica após 72 horas do uso da amoxicilina dose 45-50 mg/kg/dia). Em comunidades onde o H. influenzae e a M. catarrhalis sejam produtores de betalactamase, a amoxicilina com o ácido clavulânico se constitui em uma terapia eficaz, assim como as cefalosporinas de segunda geração (cefuroxima), de terceira geração (ceftriaxona) e os macrolídeos (azitromicina). Com exceção da azitromicina, a duração do tratamento se situa em torno dos 14 a 21 dias para os casos agudos, ou até sete dias após a resolução dos sintomas.
Na sinusite subaguda e na crônica, devido à elevada incidência de micro-organismos produtores de betalactamase, a amoxicilina não é recomendada. Geralmente, prescreve-se a amoxicilina-clavulanato. A duração do tratamento deve ser, de pelo menos, quatro semanas.
A instilação nasal regular de solução fisiológica tem como objetivo manter a mucosa hidratada e remover o muco em excesso, que prejudica a função ciliar.
Os anti-histamínicos, devido a seus efeitos anticolinérgicos. promovem um espessamento da secreção, e não devem ser utilizados, a não ser em casos de rinite alérgica associada. O spray nasal de corticoide reduz o edema de mucosa em pacientes atópicos e naqueles com sinusite crônica ou muito sintomáticos.

COMPLICAÇÕES

CELULITE PERIORBITÁRIA

Uma complicação preocupante, na qual a infecção se alastra do seio etmoidal (sinusite etmoidal) para o tecido subcutâneo periorbitário. A criança se apresenta com importante edema e sinais de flogose na região palpebral e peripalpebral, além de febre e queda do estado geral. Está indicada internação hospitalar e antibioticoterapia venosa (cefuroxima venosa, ceftriaxona, amoxicilina-clavulanato).

CELULITE ORBITÁRIA

Complicação bastante grave e temida da sinusite etmoidal. Se não tratada de forma adequada, leva rapidamente à perda visual e/ou infecção no SNC. O paciente apresenta-se com os sinais flogísticos periorbitários acrescidos de proptose e oftalmoplegia. Conduta: internação hospitalar imediata e antibioticoterapia venosa (igual à de cima). A drenagem do seio etmoidal pode estar indicada.

INFECÇÃO NO SNC

Meningite, abscesso (epidural, subdural, cerebral parenquimatoso), trombose do seio cavernoso.

REFERÊNCIAS

CAMPOS JUNIOR, D; BURNS, D. A. R; Tratado de pediatria : Sociedade Brasileira de Pediatria. 3ª Ed. Barueri, SP : Manole, 2014.
KLIEGMAN, R. M; et al. Nelson, tratado de pediatria. 18ª Ed. Rio de Janeiro : Elsevier, 2009.

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